Imagens de satélite mostram a superfície da Groenlândia no dia 8, à direita, e no dia 12, à esquerda Nasa
Um derretimento de neve muito acima da média na Groenlândia intriga cientistas, que não veem fenômeno semelhante há 123 anos, e pode provocar mudanças no gelo permanente local, se ocorrer novamente na próxima década.
O desaparecimento da cobertura seguiu, este mês, um ritmo acelerado: no dia 8, 40% da superfície normalmente envolta por neve no inverno fora convertida em lama. Quatro dias depois, este índice saltara para 97%. Normalmente, apenas metade da área que recebe neve se vê livre dela em julho, quando o território está em pleno verão.Se novos derretimentos semelhantes voltarem a ocorrer com frequência nos próximos anos, um aumento do nível local do mar poderá ser sentido, afetando a população de 56 mil habitantes e, provavelmente, repercutindo no restante do mundo.
É que, por enquanto, o seu gelo eterno não foi atingido. A ilha concentra 6% do volume de gelo global.Massa de ar ligada à seca nos EUAO derretimento foi detectado até em uma estação a 3,2 km de altitude, região em que, normalmente, não há derretimento algum de neve, mesmo no verão. E o fato de este calor estar subindo a montanha é uma das maiores preocupações dos climatologistas.— A calota glacial da Groenlândia cobre 1,7 milhão de km². Uma geleira, para sobreviver, tem uma área de acumulação e outra de perda. O problema é que, naquela ilha, a área de acumulação é cada vez menor — lamenta Jefferson Cardia Simões, coordenador-geral do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Criosfera. — É um ano anomalamente quente no cume da Groenlândia.Os pontos mais altos daquele território viram as temperaturas galgarem dos -25º Celsius para 0 grau Celsius em menos de uma semana — entre os dias 5 e 11 de julho.
Um dos primeiros a perceber a mudança foi Thomas L. Mote, diretor do Departamento de Geografia da Universidade de Georgia, nos EUA.— Vimos uma forte e estranha massa de ar quente movendo-se pela cobertura de gelo naquela semana — lembra-se. — Ela estagnou sobre a camada de neve e produziu muito mais calor do que seria normal para as condições meteorológicas daquele local.Segundo Mote, o fenômeno climático registrado pelos três satélites da Nasa com que trabalhou o seu grupo é o mesma responsável pela seca em curso na região central dos EUA. Mas, antes mesmo desta massa quente, a Groenlândia já enfrentava, desde o fim de maio, uma chegada antecipada de seu verão. O “efeito adicional”, como chama Mote, é que “a área de grande derretimento” ficou ainda mais exposta em meados de julho, quando parte desta cobertura de neve do inverno vira lama.— Boa parte da área derretida no dia 12 rapidamente recongelou até o dia 21. O mesmo não ocorreu com aquelas regiões que perderam neve no dia 8 — destaca o geógrafo americano. — Os locais mais próximos à margem da cobertura de neve experimentam três ou quatro meses de derretimento quase contínuo anualmente. Já as áreas no interior veem o mesmo fenômeno poucos dias por ano, quando ele acontece.Mote e Simões acreditam que o aquecimento insólito da Groenlândia acende o sinal amarelo: se não se repetir na próxima década, o que está acontecendo agora é irrelevante. Se, no entanto, outro verão rigoroso como este se repetir a curto prazo, a cobertura de gelo eterno da ilha teria sua estabilidade comprometida.
Em 30 anos de observações por satélite, a maior extensão sem neve na Groenlândia foi registrada dez anos atrás, quando 75% da superfície normalmente coberta se transformou em lama.Semana passada, um pedaço de gelo de 120 quilômetros quadrados se desligou da Groenlândia e deslizou em direção ao mar. Este fenômeno, porém, não está ligado ao verão mais quente.
Fonte: http://oglobo.globo.com/ciencia
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